Prof. Ráriton Cassoli

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quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Atividade 1 - Roteiro de Leitura "Dom Casmurro"


Dom Casmurro - Edição, introdução, guia de leitura, textos de capa

Contracapa - Publicado pela primeira vez em 1900, Dom Casmurro é o romance mais famoso e polêmico de Machado de Assis. Ambientado no Rio de Janeiro do século XIX, é narrado por seu protagonista: o Dom Casmurro, um velho solitário e frustrado que, em virtude de sua “simpatia”, recebe esse apelido de um conhecido.
O personagem busca, por meio da narrativa, rememorar e compreender fatos do seu passado: principalmente os que envolvem uma mulher: Capitu, a personagem mais intrigante e misteriosa da literatura brasileira.
A polêmica toda se centraliza em uma dúvida: Capitu é ou não culpada de adultério? Os fatos até podem indicar que sim, mas o leitor não pode deixar de atentar para um fato: Bento Santiago – o Dom Casmurro –, além de narrador, é advogado. Não teria ele todos os atributos intelectuais para envenenar a narrativa, de modo a convencer o leitor a condenar Capitu?
Obra lida no mundo todo por sua genialidade não pode deixar de ser deliciada pelo leitor brasileiro.

Orelha da contracapa - Órfão, pobre, mulato, gago e doente em pleno século XIX, Machado de Assis, apesar das dificuldades, foi tipógrafo, comentarista, jornalista e, como escritor, tornou-se um inegável prodígio da Literatura Brasileira.
Autor de vasta obra entre praticamente todos os gêneros, foi no romance e no conto que mais se destacou. Com seu estilo conciso, sua ironia, seu humor e com a análise psicológica dos seus personagens, Machado de Assis inaugurou o Realismo no Brasil e foi o autor mais importante do estilo em nosso país.

Orelha da capa - Os críticos estavam interessados em buscar a verdade sobre Capitu, ou a impossibilidade de se ter a verdade sobre Capitu, quando a única verdade a ser buscada é a de Dom Casmurro. Silviano Santiago
Dentro do universo machadiano, não importa muito que a convicção de Bento seja falsa ou verdadeira, porque a consequência é exatamente a mesma nos dois casos: imaginária ou real, ela destrói sua casa e a sua vida.  Antônio Cândido
Um homem inteligente, sem dúvida, mas simples, que desde rapazinho se deixa iludir pela moça que ainda menina amara, que o enfeitiçara com a sua faceirice calculada, com a sua profunda ciência congênita de dissimulação, a quem ele se dera com todo ardor compatível com o seu temperamento pacato. José Veríssimo
Até você, cara - o enigma de Capitu? Essa, não: Capitu inocente? Começa que enigma não há: o livro, de 1900, foi publicado em vida do autor - e até sua morte, oito anos depois, um único leitor ou critico negou o adultério? Dalton Trevisan
Quem fica tiririca, e com toda a razão, com essa história mal contada, e tão mal contada que desmente o próprio Machado de Assis, é o Dalton Trevisan (...) Dar o Bentinho como o “nosso Otelo” é pura fantasia. Bestialógico mesmo. Otto Lara Resende

REALISMO - O Realismo foi um movimento literário que se iniciou na Europa, na segunda metade do século XIX, com a publicação do romance Madame Bovary, de Gustave Flaubert. Fazendo oposição ao idealismo do movimento romântico, os realistas concebiam os fatos de forma mais objetiva e fiel à vida real. Assim, o romance deixa de ter a função de distrair e entreter, como boa parte da produção folhetinesca do Romantismo, e toma nova importância: mostrar a realidade, diagnosticar as patologias humanas e sociais, apontar a corrupção e os desvios de caráter de toda a sociedade.

Contexto histórico - A partir da segunda metade do século XIX, a Europa passa por grandes e significativas mudanças. Muitas delas responsáveis pela constituição das sociedades ocidentais de hoje.
A Burguesia começa a, definitivamente, tomar espaço. Com isso, os interesses burgueses, industriais e materialistas passam a imperar; as cidades industriais se desenvolvem e o grande contingente de operários que nelas passa a viver e trabalhar revolta-se; agitações políticas espalham-se pelo continente.
Ao mesmo tempo, a ciência – sobretudo a natural – passa por um desenvolvimento tão intenso que, com seus métodos de experimentação e observação da realidade, se torna a única apta a explicar o mundo.
Influências - De acordo com esse contexto, algumas teorias, além de marcar a época, influenciaram o surgimento e a constituição dos ideais realistas. Dentre elas, destacamos:
- o   Positivismo – teoria segundo a qual apenas por meio da experiência se chega à “verdade”. Um de seus defensores foi Auguste Comte, pensador e sociólogo francês – e considerado criador da Sociologia – que defendia que a análise social deveria se basear nos métodos positivos adotados por outras ciências: como a observação, a comparação e a experimentação.
- o   Darwinismo – como ficou conhecida a teoria da seleção natural, segundo a qual apenas os mais aptos e fortes de cada espécie conseguiriam sobreviver. Foi o cientista natural inglês Charles Darwin – que chocou o mundo com o fruto de suas pesquisas (e até hoje é alvo de polêmicas) – que, com a publicação da obra A origem das espécies, embasou essa teoria. Para o Realismo, a consequência dessa corrente filosófica é a visão do homem como um animal (que, como outras espécies, evoluiu), em detrimento da visão espiritualizada do Romantismo.
- o   Determinismo – teoria segundo a qual o homem é condicionado pelos fenômenos que vivenciou, passando a ser deles consequência. Assim, fatores como o meio social e a herança genética explicam suas decisões e comportamentos.

O REALISMO DE MACHADO DE ASSIS
Para os adeptos do movimento realista, a sociedade estava cheia de problemas que precisavam ser apontados (de forma objetiva e verossímil, por isso, através da ciência) para que pudessem ser resolvidos. E esse era o papel dos realistas, diagnosticar, mostrar o que – verdadeiramente – acontecia, sem as idealizações dos românticos.  No entanto, cada autor enfocou e desenvolveu esses princípios a sua maneira. Aluísio Azevedo focou nas patologias sociais, explicadas sob a ótica determinista; Eça de Queirós, na hipocrisia da sociedade e dos seus papéis. Machado de Assis, que inaugurou o Realismo no Brasil em 1881, com Memórias Póstumas de Brás Cubas, criou um estilo completamente novo e próprio com base nesses preceitos. O cientificismo do movimento tomou forma nas suas obras por meio da análise psicológica; a crítica à sociedade desenvolveu-se com base nos indivíduos que a constituem: os homens, por isso a análise da constituição moral do ser humano.

SOBRE DOM CASMURRO  A QUESTÃO INDECIFRÁVEL: HOUVE ADULTÉRIO? Com o enredo iniciado pelo final e desenvolvido em flash-back, Dom Casmurro foi publicado pela primeira vez em 1900. O título é o apelido que Bento Santiago, o protagonista, recebeu, sarcasticamente, de um conhecido que se sentiu desrespeitado por sua falta de disposição em ouvir seus versos. Assim, o apelido tornou-se motivo de piada, e Bento acabou por aceitá-lo, afinal, combinava com a sua personalidade.[1]
Dom Casmurro, velho solitário e frustrado com a vida, busca por meio da narrativa rememorar e compreender fatos do passado: o romance com Capitu, o período no seminário, o relacionamento com os familiares e amigos, o casamento desfeito – enfim aquilo que transformou o menino – puro e ingênuo – no velho – solitário e infeliz.

A vida de Bento transcorre sem grandes incidentes até uma tarde, em 1857, quando descobre a intenção da mãe em fazê-lo padre, em virtude de uma promessa que fez ainda grávida, por ter perdido o primeiro filho. Surpreso, Bento conta tudo a Capitu – vizinha, amiga e primeiro e único amor de sua vida. O conflito os aproxima ainda mais, e eles juram no futuro se casar.
Muitos anos se passam até que o casamento possa efetivamente ocorrer. Nesse intervalo, Bento passa por diversos acessos de fúria, por ciúmes da amada. E, depois de casado, ele se mostra cada vez mais ciumento, e isso se agrava ainda mais com o nascimento do filho, que se torna a cada dia, segundo ele, mais parecido com seu melhor amigo: Escobar.
Com a publicação da obra, grande polêmica é criada em torno de Capitu. Teria ela dado razões para a desconfiança do marido? Ou teria o ciúme do marido desencadeado o adultério? Ou Capitu era, desde sempre, inocente, e tudo não passou de delírios da mente doentia de Bento?
Por um lado, alguns fatos evidenciam a efetivação do adultério: como a personalidade de Capitu – os olhares e tudo o que causava os ciúmes do marido – e a semelhança do filho com o amigo, Escobar. Em contrapartida, Capitu não tem defesa: toda a história é narrada por seu marido ciumento.
Eis o caminho para se compreender Dom Casmurro. A narrativa não segue uma ordem linear, cronológica, e sim psicológica, ou seja, o mais importante – a alma da obra – não está propriamente nos fatos, mas na constituição psicológica e moral de seus personagens. Machado criou uma narrativa completamente unilateral: só conhecemos a visão de mundo de Bento, os fatos seguem a sua perspectiva, e o próprio enredo é secundário em relação à análise do personagem.
Além disso, um detalhe torna a obra de Machado de Assis ainda mais intrigante e genial: Bento Santiago é advogado, ou seja, possui todos atributos formais para narrar os fatos do modo como lhe convém, ou como melhor convence seu leitor. Assim, como condenar alguém sem conhecer a sua versão dos fatos?
                                [1] Casmurro significa calado, metido consigo.
                                                                   Taís Gasparetti Santos

ATIVIDADE
1- Dom Casmurro é a história de um homem que supõe que sua esposa o traiu com o melhor amigo. Primeiramente, o narrador revira o passado mais remoto (o da juventude) em busca de provas que justifiquem a suposta tendência de Capitu à traição. Depois, no passado mais próximo (o da vida adulta), ele encontra e apresenta as provas, que entende como definitivas, do adultério. E, em função desta certeza, destrói o casamento.
a)     Na sua opinião, Bento Santiago é um narrador totalmente insuspeito. Por quê? Relembre as desconfianças do personagem em relação às ações de Capitu, na primeira parte do romance, que corresponde ao namoro juvenil. Quais as cenas onde isso fica mais visível?
b)   Aponte as provas principais que Bento julga dispor, já depois de casado, do adultério (hipotético ou real) de Capitu.

2- Em sua exposição, Bento afirma o adultério, mas a narrativa apresenta tantos paradoxos e contradições que nada se esclarece totalmente para o leitor. Todos os elementos que compõem a acusação possuem aspectos nebulosos e dúbios. Há sempre uma forte relativização em tudo o que o narrador afirma, pois cada registro da traição remete à possibilidade contrária. É como se houvesse dois textos na composição do romance. No primeiro, Bento, o narrador, assegura ao leitor a existência do adultério. No segundo texto – menos explícito, e nem sempre perceptível– ele registra os seus ciúmes doentios e quase paranóicos. No primeiro texto, Capitu traiu. No segundo, provavelmente não.
a)            Você concorda com aquilo que Bento declara a respeito do “crime” de Capitu ou com o aquilo ele deixa subentendido, isto é, a possibilidade de inocência da esposa?
b)            Você seria capaz de identificar no romance passagens que evidenciam esta duplicidade do narrador, ou seja, uma revelação “definitiva” da traição sempre seguida, ou mesmo antecipada, por uma referência que coloca em xeque as suas próprias convicções?

3-  A ambigüidade do romance está centrada também no confronto entre a aparência e a essência da alma humana. O que, em dado momento, é apresentado como verdade pode ser apenas uma ilusão, um engano de ótica. O mundo concreto é movediço e não tem um único sentido, uma única explicação. Por não conseguir perceber a interioridade dos demais, os indivíduos se vêem, muitas vezes, conduzidos por versões equivocadas a respeito das intenções e das ações dos outros.
a) Releia o capítulo CXXIV para perceber com clareza o que se afirmou acima.
b) Assinale algum outro exemplo no romance que confirme este jogo entre aparência e essência.
c) Comente o texto abaixo do crítico Antonio Candido:
Não importa muito se a convicção de Bento seja falsa ou verdadeira, porque a conseqüência é exatamente a mesma nos dois casos: imaginária ou real, ela destrói a sua casa e a sua vida.

4- O crítico Flávio Loureiro Chaves afirma que o tema de Dom Casmurro não é o adultério, e sim que este é apenas um pretexto para atingir numa região mais profunda das desgraças humanas, o problema do ciúme, entrevisto como deformação patológica. Segundo o mesmo crítico, Dom Casmurro é o romance da dúvida porque embora o personagem expresse a convicção de ter desvendado um crime, o acúmulo de ambigüidades no texto mantém a incerteza e o caráter nebuloso do acontecido.
a) Você concorda com a opinião do referido crítico? Por quê?
b)- Releia o capítulo CXXXV, onde Bento Santiago vai assistir a uma representação de Otelo. Influenciado pelo astucioso Iago, o mouro Otelo vive o tormento do ciúme sem qualquer base real, pois sua esposa Desdêmona o ama. Por se considerar vítima de uma traição, Otelo mata a mulher e depois se suicida. Qual é a conclusão que Bento tira da peça?
c)- Você acha que o sofrimento do narrador é real, mesmo que a causa do mesmo possa ser imaginária? Exemplifique com alguma passagem do romance.

5- Há duas tendências interpretativas dominantes sobre a intensidade e a brutalidade dos ciúmes do protagonista. Uma, mais sociológica, aponta para o caráter de senhor patriarcal de Bento Santiago, que veria a mulher como propriedade sua; outra, mais psicológica, atribui-lhe uma insegurança doentia que o leva a desconfiar de todo e de todos.
a) Na sua opinião, Bento age assim por causa do sentimento de posse nascido de sua visão patriarcalista? Ou a origem deste sentimento que o infelicita vem de uma personalidade enferma? Ou o seu ciúme é compreensível (e natural) face à paixão extrema que nutre por Capitu? Ou, ainda, a sua exasperação resulta da soma de todos estes fatores?
b) Supondo que Capitu houvesse traído efetivamente o seu marido, você julga que as decisões de Bento e sua frieza sentimental (que o leva a comemorar o desaparecimento das testemunhas do suposto crime) não seriam – do ponto de vista ético – desproporcionais à gravidade de uma adultério? Ou, em síntese, a violência destruidora do protagonista não seria muito mais condenável do que a eventual traição de Capitu?

6- Como você deve ter percebido, as reações do protagonista frente aos seus dramas existenciais são diferenciados na fase adolescente e na maturidade. Sua inércia juvenil parece traduzir uma fraqueza de vontade e um coração subjugado pela ordem familiar conservadora. A ruptura com este posicionamento passivo dá-se através do casamento. A partir de então, Bento Santiago tenta, de forma desastrada, comandar a relação conjugal e administrá-la conforme o poder outorgado aos homens. Seu poder, no entanto, revela-se frágil e sem grandeza.
a- Você lembra de episódios que explicitem estas diferenças no comportamento do protagonista?
b- No período juvenil, quem toma as iniciativas tanto no relacionamento afetivo quanto nas respostas aos problemas gerais da vida? Cite um exemplo desta conduta dominadora.

7- A personagem Capitu é uma das maiores criações de Machado de Assis. Sua complexidade psicológica é visível mas, ao desvendar sua personalidade, o escritor cria mecanismos sutis que impedem a mesma de aparecer em sua totalidade, envolvendo-a em uma aura de mistério e tendências difusas.
a- Na sua opinião, quem é Capitu? Uma arrivista esperta? Uma moça dominada pelo cálculo e pelo fingimento? Alguém que ama generosamente? Uma jovem que transforma a ânsia de viver no elemento decisivo de sua história pessoal?
b- Aponte algumas das célebres metáforas com que Machado (in)definiu Capitu.
c- Ainda adolescente, Capitu já nos é apresentada pelo narrador como mulher até a ponta dos dedos. Qual é o significado desta afirmativa?
d- Como Capitu reage às suspeitas de Bento e a decisão deste em terminar com o casamento?
e- No último capítulo, o narrador escreve que a Capitu menina estava dentro da adulta, como a fruta dentro da casca. O que ele quer dizer com isso?